O enclave das novas gerações - Socialismo e consciência

 Cada geração deve, numa relativa opacidade, descobrir sua missão, cumpri-la ou traí-la.Os Condenados da Terra (Les Damnés de la Terre), Frantz Fanon.

Um embate me parece presente na nossa geração (sou nascido em 1997 para entendimento da contemporaneidade que eu falo).

Um embate de consciência, uma reflexão angustiante entre eixos opostos mediante a inexorável presença da morte.

Um embate quanto ao sentido do trabalho.


Observo com muita estranheza as gerações anteriores à minha. 

Até mesmo as mais próximas me parecem todos alienígenas, na minha opinião.

Para eles a execução do trabalho, seja ele qual for, tem um sentido prático e pragmático muito bem estabelecido em suas mentes. Para eles, o trabalho tem fins de base, ou seja, serve para você conseguir duas coisas fundamentais: dinheiro e sentido de utilidade, não à toa que chamamos de dias úteis.


Para eles (de maneira generalizada é claro, ou seja, estou cometendo um equívoco aqui, afinal sempre que generalizamos cometemos equívocos; peço perdão se você não se identifica com esse ponto de vista) isso basta.


O problema para nós é que isso não basta.


Infelizmente para nós, felizmente para os futuros nós, buscamos sentidos abstratos no trabalho. Buscamos satisfação em acordar de manhã não apenas pela utilidade, mas sim pelos nossos corações e almas.


Buscamos o transbordar da vida pela beleza do ofício em prol da coletividade. 


Um fim da individualidade para um transbordar do indivíduo enquanto humano e não enquanto “mão de obra”.


Não queremos mais ser o custo na fórmula do preço. 

Não queremos ser cobrados e espremidos por uma sociedade que nos força a cada vez mais produtividade, em que nos é exigido, cada vez mais, fazer mais com menos, ou seja, produtividade, ou seja, vampirismo.


Não queremos ter nossas vidas ceifadas pelo capital alheio, ainda mais se tratando de uma sociedade que impõe um sistema de competição que, obviamente, trava aquilo que nos faz ser ser humano: a coletividade.


Não queremos mais o capitalismo.


O problema disso tudo é que nesse momento (acredito que de transição), vivemos em um enclave.


Ora, a nossa luta esbarra no boleto do aluguel no final do mês.

Apesar de sabermos que a nossa luta é transgeracional e que lutamos por nós, por quem está por vir e também por aqueles que morreram lutando por nós; temos que pagar uma droga de uma fatura de um cartão de crédito no final do mês.


O enclave pode ser solucionado e visto, mediantes uma perspectiva prática, com uma simples proposta de solução: faça as duas coisas.


Ou seja, trabalhe e nas horas vagas milite. Certo?


Pois é, mas e onde ficam nossos corações e almas nisso?

Onde fica o nosso sentimento ao acordar de manhã e termos que juntar todos os cacos que compõem o nosso ser?

Onde fica aquele papo no café repleto de egos e máscaras?

Onde fica aquele almoço interesseiro com o “time” para engajamento, com claros fins de “motivação” para extração de mais lucro com mais entrega de trabalho? Ou melhor dizendo, com mais entrega da sua vida.


A nossa consciência grita e tudo o que conseguem dizer para a gente é: “procure esse remédio aqui e faça uma atividade física, você vai melhorar”.

A nossa consciência grita e tudo o que conseguem dizer para a gente é: “você tem que se garantir agora, para ter uma aposentadoria farta”; ao passo que olhamos para os lados e vemos um mundo fadado a um iminente e evidente colapso climático.

A nossa consciência grita e tudo o que conseguem dizer para a gente é: “é a vida, fazer o que”.


A nossa consciência grita e não conseguimos perceber como as redes sociais são o cigarro da nossa geração.


É claro que uma busca abstrata irá exigir desafios mentais, além dos práticos.

É claro que uma busca abstrata irá apresentar enclaves de consciência, independente do recorte social que falamos.


Não basta falarmos “organizem-se”. Precisamos discutir conceitos abstratos. Precisamos lançar mão daquilo que nos toca mais fundo. Precisamos discutir espiritualidade, doa a quem doer, afinal, o enclave da nossa geração é de consciência.


É um de cada vez.


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